Informação, tecnologia e Direito Constitucional foram temas comuns aos dois workshops realizados na manhã da quarta-feira, no VII Fórum Jurídico de Lisboa, parceria entre a Fundação Getulio Vargas (FGV), o Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL). O fluxo de notícias e opiniões pelas redes sociais, as mudanças impostas à mídia tradicional pelos novos modelos e plataformas de distribuição de conteúdo e a disseminação de fake news e discursos de ódio foram debatidos pelos palestrantes, nesse último dia do encontro.
Sofia Ronchordás, Pós-doutora pela Universidade de Yale e Professora da Faculdade de Direito da Universidade de Groningen (Holanda) disse que o advento das redes sociais deu ao cidadão uma falsa sensação de participação e que, apesar de atraente, a impressão de gratuidade das redes – a ideia de um espaço que não cobra nada em troca pelo seu uso – é traiçoeira. A pesquisadora lembra que todo usuário abastece as empresas de tecnologia com seus dados pessoais e que esse modelo de negócio vem se consolidando pelas big tech, as grandes corporações da era digital.
Essa nova dinâmica de comunicação impôs aos veículos tradicionais de mídia um desafio – o de manter-se relevante diante de um cenário em que todos são potencialmente produtores de informação e opinião. Luísa Meireles, diretora da Agência Lusa, fez o registro de que fake news não são fruto exclusivo dessa era tecnológica, mas teve seu potencial devastador incrementado significativamente. Estudos apontam que as fake news ligadas a temas políticos, por exemplo, circulam três vezes mais rápido do que as demais. “Não sei o que é pior: um mundo em que se acredita na mentira ou um que se recusa a acreditar na verdade”.
O Professor Catedrático da FDUL, Carlos Blanco de Morais, afirmou que mídia tradicional tem méritos em identificar as fake news, mas ela mesma não está imune a manipulações deliberadas nem pode ser considerada a “última guardiã da isenção”. Para ele, o debate da regulamentação do ciberespaço deve acontecer, da mesma forma que se instituiu regras para a imprensa tradicional. E ressalva ser preciso defender a liberdade sem ferir a democracia: “A censura asfixia a democracia”.
Regulamentação também foi tema da intervenção do Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e Diretor-geral da Escola da Magistratura do mesmo estado, André Gustavo Corrêa de Andrade. Ele tratou do que se convencionou chamar de discursos de ódio – ou hate speeches. Registrou que dificulta a identificação desse tipo de discurso – e consequentemente a instituição de restrições jurídicas à sua prática – o fato dessa expressão não fazer referência a um “conceito unívoco e consensual”. Andrade diz que falta à expressão contornos precisos, universalmente aceitos e aplicáveis às diversas culturas e aos respectivos ordenamentos jurídicos.
Nesse sentido, o Procurador do Distrito Federal e Professor Adjunto do IDP, Jorge Galvão, e o Professor Catedrático da Universidade de Granada (Espanha), Francisco Balaguer Callejón, apontaram, cada um em seu painel, a necessidade de o Direito avançar mais rapidamente para fazer frente às mudanças aceleradas que guiam o meio digital. Callejón ponderou que nos primeiros anos do século 21, a tecnologia evoluiu o equivalente ao avanço conquistado durante todo o século 20. O Direito, porém, não acompanhou a evolução.
Para Galvão, as tecnologias e as novas dinâmicas instituídas colocam para as sociedades a necessidade de refletir sobre a liberdade de expressão. As teorias em vigor, baseadas nos desafios do século passado, já não dão conta da realidade. É preciso repensar a liberdade de expressão e a dignidade da pessoa humana dentro do novo contexto.
Também participaram dos workshops “Democracia, imprensa profissional e redes sociais” e “Hate speech, fake news e redes sociais” Evgeny Morozov, Pesquisador visitante da Universidade de Stanford, e Rui Lanceiro, Doutor em Ciências Jurídico-Políticas pela FDUL.
Confira na íntegra o workshop Democracia, Imprensa tradicional e Redes Sociais no VII Fórum Jurídico de Lisboa:
Confira na íntegra o workshop Hate Speech, Fake News e Redes Sociais no VII Fórum Jurídico de Lisboa: